domingo

Capítulo 12 - A linda dele (Parte 2)

Meu amor por ele era tão platônico quanto o amor que eu tinha por todas aquelas coisas das prateleiras do supermercado que a minha mãe nunca me deixava ter. Todas juntas. Dos danoninhos que congelavam às coleções de meio milhão de cores da Faber Castell. Coisas que eu nunca tive. E aquele beijo na minha testa me doeu mais do que o normal. Doeu como levar uma machadada na auto-estima que já me era pouca, doeu porque aquele beijo agradecia por um amor que não era meu. Doeu como se picotassem meu coração com uma faca cega. Doeu como as coisas que eu nunca tive me doíam. Assim como eu nunca o teria.

Eu girei a chave na porta, Sal entrou no apartamento logo depois de mim. Verônica estava entretida com a novela, sentada no sofá da sala e Marcela lavava um resto de louça. Eram umas nove e pouco quando ele perguntou, passando o olhar pela sala depois que eu dei boa noite sozinha e joguei minha bolsa sobre o balcão:

- Cadê a Alice?

- Tá lá no quarto. Terminando um trabalho eu acho. - Marcela respondeu. - Pode ir lá.

Sal fez que sim com a cabeça, foi andando pelo corredor e deu uns três toques na porta. Ela abriu. Sem falar nada. Nem oi, ou boa noite. Ele entrou, ela simplesmente fechou a porta. E, obviamente, eu e Marcela corremos cada uma com um copo pra encostar a orelha na porta e escutar a conversa.

-... Se foi só pra dizer boa noite que você veio aqui eu acho que você perdeu seu tempo. - Alice falava ríspida, provavelmente sem olhar pra ele.

- Que tenso, gente. - Marcela comentou num sussurro do meu lado.

- Me mata isso de você me tratando desse jeito. Eu vim aqui pra acertar as coisas com você, Alice, e olha o jeito que você me recebe. Tira esse monte de pedra da mão e olha pra mim. Por favor. - Eu imaginei que ele virando delicadamente o rosto dela pra si, passando a mão pelo desenho do rosto dela.

- Eu... Eu estive pensando, e talvez... Talvez não fosse pra ser... Nós dois, Sal. A gente é muito diferente... S-são mundos diferentes. - Ela falava sem conseguir concluir o raciocínio, gaguejando como fazia quando estava com medo.

- Ela tá terminando com ele? - Sussurrou Marcela, eu fiz um "cala a boca" e continuei prestando atenção no som que saía de trás da porta.

- Mundos diferentes? - Ele repetiu e ficou calado por um tempo até respirar fundo e dizer tudo de uma vez. - Meu mundo gira em torno da saia do seu vestido, do desenho da sua boca, e na rouquidão da sua risada. Meu mundo bate no coração do seu peito que apressa o passo quando fica desse jeito assim, perto do meu. - Mesmo que eu não pudesse ver, ainda conseguia ouvir daqui o que seriam prováveis soluços do choro de Alice, se chegando num abraço dele. - Meu mundo são os lugares onde você já passou, são as fotos que você tirou, são as músicas que eu ouvi pensando em você. O meu mundo é você, minha menina linda. Você, seus tênis riscados e a sua câmera. Você, aquela camisa do Red Hot e a nossa dança. Você, seus olhos dessa cor que eu não sei o nome e aquele som que tu faz mastigando bolacha de água e sal. - Ele parou um minuto e ela perguntou num leve tom de desespero:

- E sobre o que aconteceu naquele dia?... E se eu não conseguir? E se... Você for embora depois que me tiver?

- O que eu sinto por você é amor, não uma lata de doce de leite. - Sal respondeu como se tivesse se ofendido com a pergunta dela. - Eu não vou enjoar de você, nem jogá-la fora quando o doce acabar, por favor, acredite. Eu vou estar aqui, enquanto você quiser que eu esteja, enquanto você puder me aguentar. - Meus olhos encheram d'água, Marcela me olhou com dó, sem dizer nada. Eu sabia que era um pedido de desculpas implícito no beijo que ele deu nela antes de sussurrar (provavelmente, em sua orelha) - Eu sou seu, minha linda.

Marcela tirou o copo onde eu estava encostada da porta.

- Você não tem que ficar ouvindo isso, Beca. - Ela cochichou - Pare de se torturar.

Eu segurei o copo, enxuguei uma lágrima teimosa que me tinha caído, saiu rasgando meu rosto. Sorri, cochichando de volta pra Marcela.

- Eu só estava... Tentando me convencer. É ela, a linda dele. Não eu. - Tirei o copo dela da porta também. - Deixa os dois conversarem sozinhos. Anda.

E fui andando de volta pra porta, deixando os copos sobre o balcão da cozinha, os dois sozinhos no quarto que era meu também, abri de leve a geladeira sem muito prestar atenção no que pegar e saí pra me sentar na escadaria tomando meu Toddynho e chorando sozinha como se não houvesse amanhã.

quarta-feira

Capítulo 12 - A linda dele

Foram horas tentando assimilar nomes de drinks e sacodindo copos tentando conversar e parecer bonita ao mesmo tempo. Meus futuros colegas de trabalho pareciam muito com todas aquelas pessoas bonitas que se vê nas revistas, os rapazes - fossem seguranças, garçons, barmans ou gogo-boys - eram daquele tipo que devia fazer chover mulher, e as mulheres - fossem o que quer que fossem, bem... eram re-al-men-te lindas, e eu definitivamente não sabia o que estava fazendo lá.

- Rebeca. - Uma voz grave me chamou, enquanto eu tentava decorar a ordem das cores das garrafas embaixo do meu ponto no bar, depois de anunciado o intervalo dos workshops.

- Pois não? - Respondi, levantando rápido e (pra variar) taquei a cabeça no balcão. - AI. Ai. Desculpa. Ai. Oi chefe. - Alguém pode por favor me arrumar um buraco pra enfiar minha cabeça. Com gelo, por favor.

- Cuidado aí, menina. - Ele falou, me ajudando a sair enquanto eu esfregava minha testa. - Hahahaha.

- Tudo bem, seu Roriz. Ótimo que agora eu sou a piada do chefe. - Ele continuou rindo.

- Seu Roriz é? - Eu fiz que sim com a cabeça.

- Ou prefere só chefe mesmo? - Discordando de mim, ele sorriu e pegou um saquinho no bar, encheu de gelo e botou na minha cabeça.

- Seu Roriz é o meu pai. Pode me chamar só de Renato mesmo.

- Beleza. - E apontei pro saquinho, sorrindo. - Obrigada, Renato.

- Os instrutores falaram bem de você.

- Te disse que eu aprendia rápido. - Renato concordou, então de repente eu estava fazendo alguma coisa certa.

- Tudo bem, vou parar de te prender pra você ir aproveitar seu intervalo. - Ele apontou pra perto da mesa de aperitivos - Seu namorado não pára de olhar pra cá.

Era Sal, acenando quando eu olhei. Eu levantei a sobrancelha e tirei o saquinho de gelo da cabeça.

- Ele não é meu namorado. - Falei. Renato sorriu, deu meia-volta e disse antes de ir andando até sua sala:

- Que azar, o dele.

Não deu dois minutos e Sal veio andando até onde eu estava, me ofereceu um pratinho cheio dos negócios da mesa e sentou do meu lado, sem dar uma palavra.

- Nossa, eu nem sabia que ainda existiam Tortuguitas. - Eu disse enquanto devorava a cabeça e as pernas de uma das que ele me havia botado no pratinho.

Sal concordou com a cabeça, abocanhando uma delas, toda de uma vez, olhando pro nada, sem dar uma palavra. Eu amarrei meu cabelo e soprei a franja dos olhos.

- Você quando tá com a Alice passa o tempo inteiro assim calado ou eu sou tão desinteressante assim pra ficar ignorando até minhas m...

- É que eu quero falar com você. - Ele me interrompeu. - Só não sei como começar, nem sobre o quê, mas eu adoraria falar com você, Rebeca.

Um pequeno sorriso irônico se abriu na minha boca enquanto eu jogava alguns cinco pastéizinhos nela.

- Eu sou uma pessoa. - Mastiguei duas ou três vezes e enoli. - Não um bicho. - Sal riu.

- Do jeito que você come, parece mesmo um bicho. - Eu ri e dei um murro carinhoso no braço musculoso e escultural tão lindo quanto o sorriso dele.

- Mas e aí? Como está indo seu treinamento?

- Tá bacana o negócio. Não quebrei nenhum copo, não derrubei nenhuma bandeja... A moça da instrução olhou tanto pra minha bunda que eu acho que vou ficar na sala VIP. - Nós dois rimos por um tempo até ele ficar sério outra vez. - Não fala da moça da instrução pra Alice não, tá?

- Tudo bem, eu entendo... Sem querer eu ouvi vocês dois conversando hoje depois do almoço.

- Era sobre ela que você queria falar quando me mandou aquela mensagem, né? - Eu confirmei com a cabeça. - Depois de domingo eu fiquei sem a menor ideia do que fazer, ou de como agir. Alice é diferente de todas as mulheres com quem eu já estive. Diferente demais.

- Garotão, vou te contar um segredo: Todas as mulheres são diferentes umas das outras. A diferença é que Alice te é mais especial do que todas as outras porque você gosta dela e é de verdade dessa vez. Então, por favor, não seja burro ou infantil de perdê-la só por medo de ser tão importante pra ela quanto ela quer que você seja. Seja calmo, paciente, doce, carinhoso e, principalmente, tenha cuidado com a minha amiga. Se você a ama de verdade, não vai magoá-la. Porque se você magoar a Alice, aí sim você vai ter problemas.

- Você tem razão.

- Acostume-se. - Falei, levantando a sobrancelha. - Eu sempre tenho.

Ele riu e levantou quando anunciaram o fim do intervalo, falando:

- Bruno devia tomar cuidado. - Eu sorri confusa. - O chefe parece estar adorando isso de dar em cima de você.

- Deixa de falar besteira e vai pra lá carregar copo, eu vou ficar aqui aprendendo a embebedar as pessoas. - Nós dois rimos. Sal me segurou pela mão, para que eu me levantasse e meu braço inteiro se arrepiou num segundo. Corri pra tirar minha mão da dele antes que ele pudesse notar. - Anda, antes que eu perca meu emprego e você o seu, a moça tá chamando.

- Obrigado, Beca. De verdade. - Eu ri muito, voltando pra trás do meu ponto no bar.

- Não gasta todos os agradecimentos de uma vez só não que eu tô prevendo muito tempo pra frente ajudando nesse namoro de vocês dois.

- Beleza... Eu volto pra república com você quando acabar aqui, tudo bem? - Fiz que sim com a cabeça, acenando um vá embora com a mão.

- A gente se vê na saída então, garotão. - Ele deu meia-volta e foi andando até o seu próprio setor, e eu toda bocó olhando o desenho dos ombros dele sob aquela camisa bonita. E bem que a instrutora tava certa, com os atributos que tem esta criatura de Deus, devia ser crime ele andar por aí sem nenhum aviso prévio. Suspirei me deixando roer de carência, decorando o desenho das costas de Sal por um segundo ou dois, até tomar vergonha na cara e voltar pras minhas cachaças coloridas.

~

Quando eu saí ela já estava perto do portão, sentada sozinha debaixo da luz do poste, rodando entre os dedos uma garrafa de um jeito bonito, parando-a no ar e enchendo um copo imaginário com a outra mão.

- Olá. - Eu disse, e Beca tomou um susto, quase derrubou a garrafa e o copo imaginário, se fosse de verdade, teria se espatifado todo no chão. Ela xingou algo que eu não ouvi, sorriu nervosa e levantou rápido.

- Vamos? - Confirmei com a cabeça ainda rindo enquanto caminhávamos para o ponto de ônibus. - Pelo menos eu não derrubei a garrafa, tá!

- Era legal, isso que você tava fazendo, girando a garrafa.

- É. - Ela concordou e continuou. - Me sinto a própria Piper Perabo em 'Show Bar'. - Como se eu soubesse quem era, e ficou rindo. - E você, a moça lá parou de olhar pra sua bunda?

- Não sei. Mas espero que meus atributos físicos pelo menos me rendam um bom lugar da pista VIP na lista que sai amanhã.

- Já eu prefiro não criar esperança nenhuma de estar no bar da pista VIP, porque né, os outros barmans são muito mais experientes do que eu e com história de parte física nem água pra mim, meus instrutores... Tinha um que não tirava os olhos do muque do cara que tava do meu lado. Derrubou umas duas garrafas, distraído com os braços do rapaz. - Nós dois rimos.

- Ah Beca, mas você tem o chefe! O cara tava praticamente te comendo com os olh... Ai. - Ela me beliscou. - Doeu!

- Pra você deixar de falar coisa besta e dar sinal pro ônibus que tá vindo aí. Anda. - Eu ri. Beca também. Nós subimos no ônibus.

Faltavam menos que duas quadras quando eu tirei os fones dos ouvidos e entrei num discreto estado de desespero.

- Eu não sei o que falar pra ela. Eu não sei o que ela quer ouvir. - Beca respirou fundo.

- Sal, eu sei que você não é tapado. Às vezes parece, mas eu sei que você não é. Ela tem medo. Medo de perder você por ainda ser... Ser...

- Virg... - Eu tentei ajudar, mas ela deu um tapa no meu braço e completou:

- Um unicórnio. Para, não ri que eu to falando sério. - Eu ri mesmo nervoso. - Alice é um tipo raro de mulher pra se encontrar por aí. O único problema dela é a insegurança revoltada que você conheceu hoje de manhã. Ela tem de frágil o tanto que tem de bonita. Então...

- Eu já entendi. - Falei, levantando pra pedir parada. Nós dois descemos do ônibus bem em frente ao portão da escadaria.

- Espero que tenha entendido mesmo, garotão. Agora vai lá ganhá-la outra vez! - Beca disse, me empurrando e dando um tapinha camarada nas minhas costas. - Boa sorte.

Eu virei de frente pra ela, baguncei seu cabelo, beijei-lhe a testa, sorri, então voltei pra subir as escadas e ter de volta a minha linda.

sexta-feira

Capítulo 11 - Tricô Das Mina (Parte 3)

- Ei menina. Dormiu aí, foi? - Por um segundo, a minha mente sonolenta combinada ao sol quente e à voz que era idêntica, eu imaginei que fosse ele. Mas não era.

- Bem que eu queria ter pelo menos dormido, viu. - Breno sorriu e sentou do meu lado no primeiro batente da escadaria. - Que horas são?

- Cinco minutos pra daqui a pouco e alguma coisa. - Ele disse, olhando para um relógio imaginário no próprio pulso e rindo, eu ri também.

- Dã. - Brinquei, bagunçando o cabelo do gêmeo que não tinha o cabelo curto nem o sorriso torto.

- Brincadeira. São umas seis e dez. Tá cedo... Mas vem cá, por que essa preocupação toda que nem dorme, hein moça? Ainda coisa da tal visita que você fez à sua mãe, é?

- Não não. Dessa vez nem minha mãe tem culpa de nada. A besteira foi toda minha mesmo... - Falei baixando a cabeça, ele bagunçou meu cabelo, todo carinhoso. - Você tem aula agora de manhã? - E ele respondeu com a cara mais empolgada desse mundo.

- Aham, tenho todos os horários na universidade agora de manhã, um ensaio de grupo da peça que a gente tá montando pro projeto lá da Escola Central. - Então eu caí na burrisse de perguntar:

- O Bruno já acordou?

- Ér... Ele não dormiu em casa, Beca. - Tenso. - Eu até pensei que vocês estavam... Juntos.

- Hum, não, tudo bem... - Eu não conseguia explicar nem pra mim mesma o porquê de eu estar tão desorientada quando levantei da escadaria sem sequer me despedir de Breno, que falou qualquer coisa na qual eu não prestei atenção alguma, bem como às sei lá quantas aulas de introdução à moda que se passaram ao longo da manhã.

- Terra para Beca. Terra para Beca. Terra para Beca. - Era Verônica perturbando enquanto eu arrumava minhas anotações.

- QUÊ.

- Calma, gente. - Ela falou, rindo. Eu respirei fundo.

- Ai, desculpa Vê. O que foi?

- Era só pra se você tinha alguma coisa preparada pra aula.

- Eu ia começar um projeto de quadrinho com eles, mas pode ficar só pra próxima semana mesmo... - Ajeitei minha mochila e a gente foi saindo do prédio. - Já sei, manda eles criarem um super-herói.

- Ótima ideia! - Verônica falou, me abraçando quando já estávamos no portão de entrada. - Tem tempo pra gente almoçar?

- Aham. Tenho que estar às três no galpão, alí pertinho da república, pro treinamento... Ainda são onze e meia, tem tempo de sobra. - Amarrava meu cabelo num rabo de cavalo e nós duas atravessávamos a rua, indo pro restaurante de sempre.
Com quinze minutos chegaram Marcela e Sal. Com mais dez, vieram Alice, João e Bruno.

- Cês já pediram alguma coisa? - João perguntou, sentando do lado de Marcela e dando-lhe um beijo na bochecha. Insisti pra trocar de lugar com Alice (ainda com a mesma cara desanimada dos dias anteriores) para que ela ficasse perto de Sal, o que magicamente me fez ficar ao lado de Bruno.

- Não não, a gente tava esperando vocês. - Verônica repondeu, mexendo no celular. - Cadê o Breno, hein?

- Acho que ele não vai vir. - Falamos eu e Bruno ao mesmo tempo. E ele continuou:

- Breno ficou organizando um monte de coisa do Centro comunitário e tal... - Ele falou, virando a página de sanduíches naturais, daí olhou pra mim. - Que você vai comer?

- Tô sem fome... Pede um daqueles sanduíches de churrasco grego pra mim. Cheio de tomate. - Bruno olhou pra mim e riu. - Que foi?

- Imagina quando você tiver com fome!

- Hahaha. Como você é engraçado. - Respondi, dando um murrinho no ombro dele, que bagunçou meu cabelo.

Depois que todo mundo terminou de comer, sob imensos protestos de Marcela sobre palitar os dentes, pagamos a conta e fomos indo em direção à saída.

Alice chamou Sal num canto, mesmo com alguma resistência, ele foi. Eu fiquei enrolando, olhando a mesa de sobremesas. Ela perguntou uma coisa na qual eu não prestei atenção, daí muito sem querer eu fui ouvindo a conversa:

- Eu.. Queria saber te explicar isso, o que eu tô sentindo. Eu só não sei como, eu juro que não sei. - Ele falou, segurando a mão dela sobre o peito dele. - Olha. Olha só o jeito que eu fico quando falo com você... Eu tenho que ir agora pra esse treinamento, e...

- Tudo bem, Sal. - Alice respondeu, séria, soltando das mãos dele. - Então quando você descobrir um jeito de me explicar porque não consegue ficar 10 minutos perto de mim sem arrumar uma desculpa pra sair de perto, você me fala. Você tem o tempo que quiser. - E saiu. Deixando ele lá, com aquela cara que pedia com os olhos um Almir Sater de viola. "Encosta sua cabecinha no meu ombro e chora".

- Sal. - Eu chamei, ele olhou e perguntou:

- Cê tá indo pra lá agora? - Eu fiz que sim com a cabeça. - Eu posso ir com você?

- Pode. - Pode ir e se quiser voltar mesmo depois da gente chegar lá, eu deixo. Eu já te deixei se jogar sem saber de cabeça no buraco negro que é meu coração e tomar conta de praticamente tudo por lá, por que não te deixaria ir comigo?

E fomos o caminho inteiro sem uma só palavra ser dita, entre uma olhar e outro que eu me permitia roubar quando ele não estava vendo. Olhar não mata. Não matava minha vontade de abraçar seus ombros perfeitos, não mata minha vontadeva de sentir o gosto da boca dele, ou de ouvir sua voz sussurrada na minha orelha, não matava minha vontade de não ser mais só, pra ter ele do meu lado, nem de ter ele pra mim. Não matava nada nem ninguém, mas pelo menos eu te podia olhar, Sal. Porque ninguém te disse, e você nunca percebeu.