quarta-feira

Capítulo 13 - Galpão (Parte 4)

Segurei a mão dele e saí carregando-o para o emaranhado de gente dançando no meio da pista, procurando o lugar com a melhor vista possível que certa pessoa pudesse ter, obviamente sem parar um segundo sequer com os múltiplos flertes recíprocos. Só aí começamos a dançar. E dançar. E dançar.

Uma eu muito concentrada em não torcer o pé - visto que salto e alcóol nunca me foi lá tão boa combinação, mas ainda assim rebolante como nunca, sob uma daquelas músicas que você conhece sem ter a menor ideia do nome ou quem canta, eu dançava com o menino do nome de uma sílaba só, querendo que fosse Bruno no lugar dele. E cada pedaço do corpo dela que Bruno ia mapeando (vulgo passando a mão mesmo), mais raiva me dava de eu não ter me deixado estar lá ao invés dela, então eu ia me chegando mais perto de Gui, eu ia me chegando mais rebolante, provocando de propósito o olhar raivoso que não parava de queimar minha nuca.

E, como eu não valho sequer o que o gato enterra, comecei a ceder um pouco às investidas do rapaz - com direito à cheiro no cangote, mãos gaiatas passeando sabe-se lá por onde e, claro, a clássica e infalível tática do sorriso maroto mordiscando o lábio inferior, com a plena certeza que o rapaz de sorriso torto e ombros bonitos com a periguete que não era eu estava acompanhando a cena passo-a-passo.

- Tem gente demais aqui, você não acha? - Gui perguntou e eu concordei. - Você não quer sair daqui, dar uma volta, ir pra um lugar mais calmo, só nós dois?

Sente o drama.

- Ér...

Alice estava com Sal, por demais concentrada em toda a sua pegação perto do bar pra conseguir dar voz à minha consciência, que tem esse mau costume de ficar completamente muda quando eu começo a beber. Verônica (que eu só conseguia identificar pelo cabelo e a cor da blusa) num canto mais escuro fazia sabe-se lá o quê com um rapaz cuja cara não dava pra ver, mas provavelmente era Breno, ou seja, eu prometo que nunca mais vou beber se minhas amigas estiverem entretidas o suficiente para não vir me salvar de mim mesma.

Foi quando por um segundo eu olhei de lado, lá estavam os braços dele envolvendo a cintura da garota, beijando-a e deixando pra mim um sorriso em deboche, depois de deixar a boca dela. Daí eu resolvi fingir que tava pouco me fudendo.

- Acho melhor a gente ficar por aqui mesmo, não quero que a minha carona me perca de vista. Então... Você vem sempre aqui? - Daí eu beijei o outro rapaz como se ele fosse o último cara com os dentes da frente na face da terra. Ele me beijou, e eu o beijei de volta com tanta vontade quanto.

Porque Bruno não me queria mais, mas eu queria que fosse ele no lugar desse cara que eu conheci há menos de uma hora. Queria que fosse o meu amigo de infância, com o beijo doce que me protegia, passando a mão pela minha nuca enquanto o tempo passava sem sequer a gente notar, e não um estranho que eu nunca tinha visto da vida até essa noite, cujo único lugar onde ele queria passar a mão era definitivamente baixo demais para ser minha nuca.

Daí eu me dei conta de que tinha feito tudo do jeito errado. Daí eu me afastei de Gui, falando qualquer coisa parecida com um "Vou ao banheiro". Daí eu saí andando de cabeça baixa - morrendo de vergonha de mim mesma, e nunca mais voltei. Daí eu bebi uma carrada de tequila de uma só vez e a última coisa que eu consigo me lembrar é dele invadindo o taxi enquanto eu tentava lembrar do endereço de casa pra dizer pro cara.

~

- Que porra é essa agora?! - Ela disse quando eu abri a merda da porta daquele taxi e entrei sem a menor cerimônia.

- Nós vamos acabar indo pro mesmo lugar, de todo jeito.

- Ah, beleza. - Beca falou, irritada, procurando (sem o menor sucesso) o lugar onde a outra porta do taxi abria.

- O que você tá fazendo? - O taxista fingiu que não tinha me visto invadir o taxi e resolveu tomar como rumo o endereço que Beca havia dado.

- Dando espaço praquela menina que tava com você, obviamente. Você não passou a vida inteira se gabando de ser um gentleman? Gentlemans levam as periguetes que pegam pra casa. A não ser que vocês não tenham conseguido decidir se era na sua casa ou na dela e tenham feito alí mesmo, pra aproveitar o banheiro unissex né?

- Para de falar besteira, Rebeca.

- Por que? Vai dizer que você não queria? Porque do jeito que vocês dois estavam numa encenação quase perfeita de como conceber um novo ser humano alí mesmo na pista de dança...

- Se eu e a Ju estávamos enc... - Beca revirou os olhos e gritou com uma raiva que eu nunca tinha visto:

- DÁ PRA VOCÊ PARAR DE CHAMAR ESSA PERIGUETE ASSIM?!

- E por que ela é uma periguete?

Ela ficou calada, fingindo estar entretida com os prédios que iam passando pelo caminho. Eu continuei:

- Pra mim, agir como uma periguete era aquilo que você tava fazendo com um avulso que não deve saber nem o nom... - Ela me olhou, rangendo os dentes de tal forma que eu imaginei o maxilar dela estalando e se partindo em dois. - Esquece.

- Anda, CONTINUA. - Eu hesitei. - Continua, pode falar o quão vagabunda você pensa que eu sou, eu aguento!

- Beca...

- Não, Bruno. Pode continuar com o seu discurso, tava REALMENTE interessante.

- Você entendeu o que eu quis dizer! Você sabe que tá errada! Aliás, como quase sempre! Nem vem dar uma de vítima pro meu lado, eu não caio mais nessa!

- Pois é, você já pegou a vaga de vítima por aqui, não é "Bruninho"?

- Dá pra você parar de fazer essas alusões grotescas à garota que tava comigo?

- Ah, Bruno, faça-me o favor...

- Ela me trata de um jeito que você nunca nem se deu o trabalho, ela me dá atenção, ela é carinhosa.

- Legal! Ela é a sua princesinha de contos de fadas. O único lugar que tem pra mim é o da vadiazona má que quebrou o seu coraçãozinho! TODOS CHORA.

- Era com ela que eu devia estar agora, e não dentro de um taxi discutindo com uma bêbada que mal sabe o que faz ou fala!

- Beleza, então agora me diz O QUE DIABOS VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI? Porque definitivamente não fui eu que te chamei.

- Dá pra parar de ser babaca só por um segundo, Rebeca?

- Não. Não dá.

- Eu vim porque fiquei com preguiça de ter que ir te procurar depois, caso você se perdesse por aí. O que não seria coisa muito difícil, vendo o quanto você está bêbada!

- Quer dizer que agora eu preciso de um guarda-costas!

- Não. De uma babá!

Ela se calou. E foi uma eternidade até o taxi parar e eu conseguir falar:

- Rebeca...

Ela não olhou pra mim.

- Eu já estou em casa, já fez a sua boa ação, ganhou uma estrelinha de bom menino, agora por que você não volta pra festa, ou pra sua adorável acompanhante ou só vai se fuder de um vez? - Ela tirou umas notas amassadas de dentro do bolso, dizendo pro taxista: - Pode ficar com o troco, moço. - E saiu abrindo o portão, subindo a escadaria cambaleante.

Eu saí correndo atrás dela.

- Rebeca... - Ela não parou de andar. - Rebeca, deixa de besteira e olha pra mim! - Ela se desequilibrou por um instante, mas não parou de andar. - Rebeca!... REBECA! - Ela respirou o mais fundo que um ser humano é capaz, parou, virou e ficou me encarando.

- O quê?

Um comentário:

Priscila Garcia disse...

Parece capítulo de novela. Acaba smp na melhor parte e mata a pessoa de curiosidade. hahahhaa
Esperando ansiosíssima pelo próximo capítulo!! :D